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Governo Dilma engavetou estudo de pesquisadores da UFC que previu cheias no RS e propôs respostas ao caos

Canoas – RS, em 05 de maio de 2024. O caos instalado com imensos prejuízos sociais e econômicos. Nada que não se soubesse há dez anos. Foto: Ricardo Stuckert /PR

A calamidade no Rio Grande do Sul não é nenhuma surpresa. As graves consequências humanas, sociais e econômicas das enchentes que atingem o estado no extremo sul do Brasil foram previstas em um estudo encomendado pelo Governo Federal. Dois pesquisadores da UFC foram responsáveis pelo capítulo que se relaciona diretamente com o caso.

Há cerca de dez anos, com o relatório nas mãos, a Presidência da República, então comandada por Dilma Roussef, decidiu simplesmente engavetá-lo. De quebra, os dirigentes que haviam contratado o estudo foram solenemente demitidos.

A informação foi apurada pelo site Intercept Brasil em reportagem assinada por Tatiana Dias: O relatório “Brasil 2040: cenários e alternativas de adaptação à mudança do clima”, encomendado em 2014 pela gestão de Dilma Rousseff, do PT, apresentava resultados dramáticos. Elevação do nível do mar, mortes por onda de calor, colapso de hidrelétricas, falta d’água no Sudeste, piora das secas no Nordeste e o aumento das chuvas no Sul.

Contratado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, na época comandada pelo economista Marcelo Neri, em 2014, o estudo custou R$ 3,5 milhões, que equivalem hoje a cerca de R$ 7 milhões.

O Brasil  2040, é fruto de um cuidadoso trabalho que envolveu mais de 30 pesquisadores de diferentes universidades brasileiras. Justamente no ponto relacionado aos recursos hídricos o estudo é assinado por pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), via Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura, sob a coordenação dos professores Eduardo Sávio Martins e Francisco de Assis de Souza Filho.

Até aí, tudo certo. A antecipação de cenários em função das mudanças climáticas é o que se espera de governos responsáveis e diligentes. Porém, há um porém. Como bem relatou a reportagem do Intercept Brasil, havia uma hidrelétrica no meio da conversa.

A gigantesca e bilionária obra da hidrelétrica de Belo Monte estava em pleno andamento. Foi aí que a previsão do estudo de possíveis estiagens na região norte do Brasil provocou as entranhas do Governo. Afinal, o estudo apontava que a Belo Monte poderia ter sua capacidade de produção de energia reduzida em 50% com a projeção da seca.

Vejam com atenção o que se deu após uma reunião na qual as conclusões do estudo foram apresentadas ao Governo Federal: Rousseff fez uma reforma ministerial e trocou Marcelo Neri por Roberto Mangabeira Unger. A equipe da Secretaria de Assuntos Estratégicos foi inteiramente substituída, inclusive os responsáveis pelo estudo, Sérgio Margulis e Natalie Unterstell. O projeto “Brasil 2040” foi encerrado e as informações deixaram de ser públicas.

Detalhe, a reportagem do Intercept Brasil só conseguiu acessar o estudo através de um site antigo (substituído, mas ainda ativo) do Ministério do Meio Ambiente no qual foi possível visualizar o Brasil 2040.

Veja aqui o Brasil 2040 – sumário executivo. Porém, vale ressaltar: Em outubro de 2015, um mês antes da Conferência de Paris, o governo resolveu lançar o estudo sem alarde, torto e incompleto. O sumário executivo foi feito pela equipe que cancelou o programa. Uma reportagem da época mostrou que o Brasil 2040 foi considerado alarmista pela própria Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência. 

O professor Eduardo Sávio, da UFC

A CONTRIBUIÇÃO DOS PESQUISADORES DA UFC
Reconhecidas autoridades em recursos hídricos e questões climáticas, os engenheiros e professores da UFC, Eduardo Sávio Martins e Francisco de Assis de Souza Filho, assinaram a certeira observação no estudo Brasil 2040: “O impacto das mudanças climáticas sobre as vazões indica uma tendência de aumento na região Sul do país… Especificamente, há possibilidades de aumento de frequência dos eventos de cheia e inundações na região Sul”. Bingo!

 

O professor Assis Souza, UFC

Os pesquisadores Eduardo Sávio e Assis Souza não ficaram apenas no diagnóstico do problema. Elencaram medidas institucionais e operacionais integradas e apontaram que ações isoladas seriam ineficazes diante dos desafios. Eles foram além sugerindo ações preventivas e de mitigação, no âmbito de uma lógica proativa, com vistas à redução das vulnerabilidades dos sistemas e das populações.

Vejam: As medidas a serem tomadas não podem ter um cunho reativo, ou seja, um planejamento de curto prazo apenas para administrar as “urgências”. Deve-se romper com a inércia e as medidas devem sinalizar ações de gestão da oferta e da demanda, fiscalização de usos e participação dos agentes sociais que possuem usos conflitantes, frente a uma realidade marcada pela incerteza e complexidade.

Além da menção para os problemas hoje verificados de forma trágica no Rio Grande do Sul, o trabalho dos pesquisadores da UFC alerta para o aprofundamento das secas, com consequentes problemas nos recursos hídricos, que tendem a afetar o Nordeste e o Norte amazônico. O quadro abaixo é bem explicativo ao expor o problema, o impacto e a ação a ser adotada.

Como bem escreveu a jornalista Tatiana Dias do Intecept Brasil, a realidade se impôs. E antes de 2040. 

 

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