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Câmara aprova projeto que institui o Código de Defesa do Contribuinte. Por Rafael Cruz

No dia 8.11.2022 a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei Complementar 17/2022, que institui o Código de Defesa do Contribuinte, uniformizando procedimentos, sistematizando direitos e deveres do Contribuinte perante as Fazendas Públicas. O texto foi enviado ao Senado.

O projeto é, sem dúvidas, um importante avanço a relação tão conturbada entre os Fiscos e os Contribuintes, trazendo como principais pontos:

Desconto regressivo sobre multas e juros de mora:

O texto prescreve um desconto de 60% se o pagamento do débito ocorrer no prazo para contestar inicialmente o lançamento; 40% se o débito for pago durante a tramitação em 1ª instância, até o fim do prazo para recurso; e 20% nos demais casos, desde que o pagamento ocorra em até 20 dias após o término do processo administrativo.
O Projeto prescreve também que se o Contribuinte confessar e desistir de contestar o débito na via administrativa ou judicial, os descontos serão incrementados em 20 pontos percentuais, de modo que no primeiro caso o desconto total pode chegar a 80%.

No caso de multas aplicadas nos casos de dolo, fraude ou simulação do Contribuinte, bem como no caso de devedor contumaz, os descontos aplicáveis serão reduzidos em 50%.

Estabelecimento de teto para aplicação de multas:

Visando a induzir o comportamento dos Contribuintes, o Projeto determina que a cobrança de multas sejam proporcionais e razoáveis, estabelecendo os seguintes limites:

• 100% do tributo lançado de ofício porque não foi declarado ou por declaração inexata;

• 100% do valor do tributo descontado na qualidade de responsável tributário e não recolhido aos cofres públicos (contribuição previdenciária do celetista, por exemplo);

• 50% do débito objeto de compensação não homologada quando houver má-fé do contribuinte;

• 20% do valor de tributos relacionados ao descumprimento de obrigações tributárias acessórias (declarações, por exemplo); ou

• 20% do valor do tributo em virtude do não recolhimento no prazo legal.

Instituição de taxas:

O projeto determina que as leis que instituam taxas devem demonstrar a relação entre o tributo e o serviço público prestado ou tornado disponível aos Contribuintes. Se a taxa se referir ao poder de polícia, isto é, fiscalização, deve ser explicitada a situação concreta a ser regulada pela atividade da Administração Pública. Além disso, deve haver proporcionalidade e modicidade entre o valor exigido e o custo da atividade estatal.

Modulação dos efeitos de decisões judiciais:

O Projeto estabelece que, nas sessões de julgamento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) ou o Superior Tribunal de Justiça (STJ), declararem a inconstitucionalidade ou a ilegalidade – respectivamente – da cobrança de tributo em determinada situação, esses Tribunais declarem a partir de quando os efeitos da decisão serão aplicáveis.
Atualmente, o STF, por exemplo, pode julgar determinado tributo inconstitucional e posteriormente analisar a partir de quando os efeitos da decisão serão aplicados, a chamada modulação dos efeitos.

Foi o que ocorreu, por exemplo no julgamento do Recurso Extraordinário 574.706/PR, em que foi declarada a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS: o julgamento que reconheceu a inconstitucionalidade foi realizado em 2017, enquanto a sessão que julgou a modulação dos efeitos foi realizada somente em 2021.

Caso o projeto seja aprovado sem alterações, o julgamento da possível inconstitucionalidade e a modulação dos efeitos deverá ocorrer de forma conjunta.

Suspensão de Processos Administrativos Fiscais:

O texto aprovado pela Câmara também altera o Código de Processo Civil (CPC) para determinar que as Fazendas Públicas sejam notificadas para suspender processos administrativos fiscais que dependam da resolução de questões de direito tributário até a resolução definitiva da controvérsia. Isso se aplica às seguintes situações:

• quando o julgamento do tema passa de uma turma para o colegiado de um tribunal por envolver relevante questão de direito com grande repercussão social (assunção de competência);

• quando o STF ou o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidirem reunir vários processos sobre o mesmo tema (incidente de resolução de demandas repetitivas) a fim de definir sobre controvérsia relacionada a questão unicamente de direito;

• quando o STF decidir que uma decisão poderá vir a ter efeitos que ultrapassem a causa julgada (repercussão geral);

• quando, no STF ou no STJ, a causa tratar de assunto relevante para a aplicação da legislação tributária; e• na concessão de medida liminar pelo STF que influenciar na aplicação de legislação tributária.

Prazo de julgamento do Processo Administrativo Fiscal:

O texto aprovado determina que as Fazendas Públicas terão o prazo de um ano para julgar a impugnação ou o recurso voluntário do Contribuinte, bem como o pedido de restituição de tributo recolhido indevidamente.

Além disso, nos casos em que houver supressão de instância – isto é, quando o Contribuinte ingressa com ação judicial durante o trâmite de processo administrativo – o Projeto prescreve que o Contribuinte deve informar a Fazenda, sob pena de multa de 10% sobre o valor atualizado do tributo discutido, como forma de evitar a prática de atos desnecessários no âmbito administrativo.

Dano Moral:

O projeto considera que haverá dano moral ao contribuinte quando a Fazenda lançar tributo, lavrar auto ou negar recurso que contrarie decisões do STF ou do STJ ou orientação vinculante consolidada no âmbito administrativo do órgão.

A exceção será para incerteza ou divergência sobre a aplicabilidade do precedente ao caso concreto, se atestada no respectivo ato administrativo.

Apesar de o Projeto de Lei Complementar 17/2022 estar sujeito a mudanças, já que foi enviado para apreciação pelo Senado, é notório o esforço para unificar procedimentos entre os mais de 5.000 (cinco mil) entres tributantes, visando a conferir maior segurança jurídica e pacificação na relação entre o Fisco e os Contribuintes.

Frisa-se que, conforme estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) e a firma global de auditoria Ernst & Young (EY) divulgado em 2019, a litigiosidade tributária no Brasil envolve valores que ultrapassam 50% (cinquenta por cento) do PIB brasileiro, ou seja, mais de metade da soma de todas as riquezas produzidas no País.

Evidente, portanto, a necessidade de trazer à lume a discussão sobre a relação Fisco-Contribuinte, não apenas no que diz respeito à uma reforma tributária propriamente dita, mas também a racionalidade dessa relação, no que andou bem a Câmara dos Deputados.

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