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Nossa eutanásia coletiva; Por Luís Sérgio Santos

Uma hipocrisia coletiva tomou conta da cidade. É aquela mesma que não vê o drogado na rua, o pedinte asfixiado, as pessoas invisíveis que pululam na cidade de Fortaleza e, quisera, fossem um fenômeno nosso.

O Edifício São Pedro, do outrora hotel luxuoso mais alto da orla de Fortaleza, foi desmantelado, aos olhos de todos, durante anos, mas sua progressiva eutanásia continuou ‘INVISÍVEL’.

Foi desconstruído a céu aberto, progressivamente, aceleradamente, sob os olhares omissos e coniventes do seu entorno, público e privado.

Ninguém ouviu a estrutura do São Pedro pedindo socorro, com seu choro gemido, silencioso, lacrimoso, doído, se espraiando em lágrimas inaudíveis durante anos. A camada
externa de sua estrutura arquitetônica, como lepra, seus gemidos de dor intestina aumentavam cada vez de mais doído e silencioso. A estrutura leprosa aumentou, não comoveu, terra de ninguém, tomada por invisíveis, mortos vivos. “Nós éramos cúmplices”.

Foi uma more anunciada, um assassinato coletivo em uma cidade sem memória. Iguais a ele, embora sem nenhuma emoção com essa densidade de hipocrisia, centenas de imóveis dos séculos XIX e início do século XX na cidade de Fortaleza viraram ou estão em vias de virar pó; uma cidade sem memória e sem história, uma cidade do passado consumado, deletado. E
alguém diz: E daí?

A decisão coletiva de eutanásia do Edifício São Pedro é uma junta de cúmplices. Guardemos o choro para o velório. Porque na missa de sétimo dia, ninguém estaremos lá.

Luís Sérgio Santos é jornalista e professor do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Ceará (UFC).

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